quinta-feira, 21 de abril de 2011

Meliponário Campos Verdes - Raízes Históricas

Minha vivência com abelhas perpassa por quase todas as etapas do meu desenvolvimento, desde criança até os dias de hoje. Durante a infância, sempre nas férias de junho, ou mesmo ao término das atividades escolares em dezembro, minha mãe arrumava minha bolsa e me mandava para a casa do meu avô, lá no Sítio Deserto no município de Riachuelo interior do Rio Grande do Norte. Meu avô relata que o sítio leva esse nome devido às habitações serem distantes uma das outras - (“uma aqui e outra acolá”) e, principalmente pelo reduzido número de pessoas que se encontram hoje morando no campo. Quando eu lhe perguntei, vô por quais motivos leva o homem do campo a abandonar o sossego da roça e ir morar nas cidades? – ele me respondeu já com o semblante visivelmente abatido: “a meu filho, hoje quase não dá pra se viver da agricultura. Há tempos atrás, nas eras de 50, 60 ganhava-se muito dinheiro com o algodão, aí veio o bicudo e as pessoas foram deixando de produzi-lo; as chuvas foram diminuindo; as terras ficaram desgastadas; as pessoas foram vendendo o gado por não terem mais condições de mantê-los... Aí vai ficando um deserto mesmo”.
Porém, o que ele mais gostava de falar era de suas histórias de caçador; das suas aventuras do tempo de rapaz; da fartura nos tempos de inverno: feijão verde, pamonha, canjica, cuscuz de milho, jerimum caboclo, macaxeira, batata, rolinha assada; do gado gordo descendo a ladeira escramuçando; do riacho da serra que botou cheia e, principalmente das abelhas fazendo mel. Meu avô sempre gostou de abelhas. E era quando ele falava das abelhas que eu mais me aproximava dele, sem saber que o destino me reservava uma das coisas mais aprazíveis que realizo em minha vida. Ele continuamente falava das abelhas nativas. Dizia que – não era necessário ir muito longe, nas proximidades de casa mesmo, nos pés de Catingueira Imburana e Pereiro havia muita abelha.
Ele falava das seguintes espécies: Tubiba, abelha pretinha e muito valente; Cupira tem um mel bastante apreciável; a Jandaíra; a Rajada; o Mosquito Verdadeiro; o Remela; a Moça Branca; a Pimenta; o Zamboque. Hoje, dentre as espécies listadas, encontra-se ainda, com bastante dificuldade nos resquícios de mata da região, o Mosquito, a Jandaíra e a Rajada. Meu avô quando as achava, abria o tronco e retirava o mel até encher a cabaça e levava a cera para utilizá-la ou em pavio de candeeiro ou para tapar os recipientes onde guardava os cereais. Esta prática se repetiu por vários anos.
No imaginário popular do caboclo, estas abelhas quando são encontradas em seu habitat natural e abertas para retirada do mel, elas abandonam a morada e vão à procura de outra. Esta concepção errônea vem contribuindo, ao longo do tempo, para a extinção de muitas espécies de abelhas sem ferrão. Pois, estas abelhas dificilmente, ou quase nunca, (existem poucos relatos sobre isso) abandonarão suas moradias para formarem outras. Um dos motivos mais aparentes é em virtude de sua rainha, esta, após sua fecundação desenvolve consideravelmente a região abdominal, impossibilitando-a de voar. Portanto, “jamais” as operárias desampararão sua soberana.
Voltando a conversa que tínhamos meu Avô e eu, ele dizia que a cada ano que se passava tinha que ir cada vez mais longe para conseguir mel, foi a partir daí que ele começou a trazer os troncos com abelhas para casa. Esses troncos eram geralmente acomodados no poleiro das galinhas ou postos sob a sombra de qualquer árvore nos arredores de casa. Eram conservadas no próprio tronco durante muito tempo, o sol, a chuva aceleravam a deterioração do tronco, ali se instalavam colônias de formigas, baratas e outros insetos, eram também presas fáceis das lagartixas; retirava-se todo o alimento quando da extração do mel, enfim, as abelhas pereciam e, depois chegava alguém e dizia – “essa daqui foi embora”. Como foi embora??? As abelhas sofriam todo tipo de ataque e, de tempos em tempos o mel era removido em épocas inadequadas, quando alguém adoecia de gripe ou inflamação na garganta. Aí vem a reflexão, há abelha que resista ao desmatamento, a ação predatória de meleiros e o manejo incorreto dos cortiços?
Em meio a todo esse contato com a natureza e com a agricultura, me fez nascer um desejo de querer aprender um pouco mais. Foi a partir daí que, no ano de 2000 me submeti ao processo seletivo da Escola Agrícola de Jundiaí. Obtive aprovação, iniciando as atividades em 2001 e concluindo em 2003. Neste período a escola passava por um processo de reforma no ensino. Enfim, não vimos praticamente nada em apicultura. Meliponicultura, nem se falava!!
Em 2005, meu tio João e eu iniciamos uma pequena criação de abelhas de ferrão (apicultura). Só que tínhamos bastante trabalho, os investimentos eram altos, neste período as chuvas foram escassas, as ajudas e incentivos menos ainda. No ano seguinte, já bem desanimado com a atividade, decidi criar abelhas nativas, como? Na Caprifeira de 2006, avistei um rapaz aqui da cidade com uma colônia de Jandaíras, trabalhando tranquilamente em meio à multidão de pessoas que visitavam a feira. Fiquei admirado, e por alguns instantes, permaneci observando e me perguntando, com certeza a criação de Jandaíras não vai me dar tanto trabalho.
No outro dia mesmo, procurei saber quanto custava as caixas, os enxames. Meu avô me doou uma, meu tio Eduardo (um dos grandes sabedores do assunto) me deu outra, comprei algumas e, assim, hoje possuo 80 colônias, dentre estas: a Jandaíra (M. Subnitida), a Rajada (M. Asilvai), o Jati (Leurotrigona) e a Moça Branca (Friesiomelita Doederlein).
Hoje, trabalham diretamente na atividade meu pai e eu, na construção das caixas, instalação dos meliponários e no manejo das colônias. O Meliponário Campos Verdes está localizado no município de Riachuelo-RN, BR 304, a 71 km de Natal (capital), no Aglomerado Rural de São Miguel, Sítio Deserto. Trabalhamos com instalação de meliponários, fornecimento de colônias, de caixas modelo INPA e Nordestina, capacitação e assessoria em Meliponicultuta.


(Casa do meu avô - Sítio Deserto)

(Primeiras colônias)

(Construção do meliponário)

 (Meu avô fiscalizando as obras)

(Construção do meliponário)

(Meliponário pronto)

Um grande abraço.
São Paulo do Potengi-RN, 21 de abril de 2011.

João Paulo Evangelista de Medeiros
Meliponário Campos Verdes

Um comentário:

  1. Olá amigo João,

    que beleza de postagem e de história de vida,vc tem tudo pra seguir em frente,pois sua paixão pelas abelhas nativas,é maior que seu interesse em fazer negócios,esse é o segredo do sucesso...

    Abraço.
    Paulo Romero.
    Meliponário Braz.

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